Precisamos falar sobre a Doença de Alzheimer
Por Rodrigo
Rizek Schultz*
Começa mais ou menos assim: a mesma pergunta é
feita várias vezes; há também uma dificuldade em acompanhar conversas e
articular; sair de carro se transforma em pesadelo porque achar o caminho não é
natural. Esses sinais evidenciam o primeiro e mais característico sintoma da
Doença de Alzheimer, a perda de memória recente. O Alzheimer é uma doença
neurodegenerativa que provoca a diminuição das funções cognitivas. Em poucas
palavras, as células cerebrais morrem, prejudicando a função mental. A
progressão da doença acarreta em problemas mais graves, como o esquecimento de
fatos mais antigos, a desorientação no espaço e irritabilidade.
Falar sobre a Doença de Alzheimer (DA) é uma
questão de saúde pública. No mundo, estima-se que 50 milhões de pessoas sofram
de demência – grupo de distúrbios cerebrais que causam a perda de habilidades
intelectuais e sociais. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a
DA é responsável por até 70% dos casos de demência1. Aqui no Brasil,
o cenário é particularmente desafiador. O número de indivíduos vivendo com
demência deve triplicar até 2050, segundo relatório da Organização Mundial da
Saúde2. E o número de pacientes diagnosticados com Alzheimer deve
crescer em proporção semelhante.
Ainda não há cura para a Doença de Alzheimer, o
objetivo do tratamento se limita a frear os sintomas. E, com a iminência do cenário
descrito anteriormente, autoridades de saúde se veem diante de uma empreitada.
Trata-se de uma enfermidade de evolução progressiva e inexorável. Viabilizar
soluções que melhorem a qualidade de vida de pacientes e cuidadores é
essencial.
Nesse sentido, alguns passos já foram dados. Por
exemplo, a ampliação do acesso aos tratamentos via Sistema Público de Saúde,
contribuindo para minimizar a progressão da doença e melhorando a qualidade de
vida dos pacientes. Há exatamente um ano, o Ministério da Saúde disponibiliza o
medicamento Rivastigmina adesivo transdérmico para tratamento da Doença de
Alzheimer, previsto no Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT)3.
O medicamento age inibindo uma enzima responsável por degradar a acetilcolina,
um neurotransmissor essencial nos processos cognitivos, principalmente a
memória4.
Ao administrá-lo, temos uma oferta maior de
acetilcolina no organismo5. A versão oral da Rivastigmina já era
oferecida no SUS, mas sua ingestão pode causar alguns desconfortos
gastrointestinais, como náusea, vômito e diarreia1. A vantagem do
adesivo é que a medicação é liberada gradualmente através da pele, reduzindo a
possibilidade de efeitos colaterais por não passar diretamente pelo trato
digestivo4.
Existem outras frentes que ainda precisam ser
trabalhadas em termos de políticas públicas. A complexidade da Doença de
Alzheimer demanda a atuação de equipes de diversas áreas e uma abordagem
integral que facilite a interação médico-cuidador-paciente. O médico atuando
sozinho, aliás, é incapaz de resolver muitas das questões relacionadas à
enfermidade. As ações multidisciplinares podem interferir positivamente no
tratamento, com melhoras significativas de problemas comuns como a depressão.
A Doença de Alzheimer pode não ter cura, mas, se
diagnosticada no início, o tratamento adequado ajuda a impedir a progressão e
amenizar os sintomas, proporcionando melhor qualidade de vida ao paciente e
reduzindo o sofrimento dos cuidadores e da família. O avanço da ciência abre um
caminho promissor e traz esperança para toda sociedade6.
*Rodrigo Rizek Schultz é neurologista e
Presidente da Associação Brasileira de Alzheimer (ABRAz)
Referências
1 Demência: número de pessoas afetadas triplicará
nos próximos 30 anos; disponível em: https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=5560:demencia-numero-de-pessoas-afetadas-triplicara-nos-proximos-30-anos&Itemid=839 (acessado em junho de 2019)
2 Projeção da População 2018; disponível em https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/21837-projecao-da-populacao-2018-numero-de-habitantes-do-pais-deve-parar-de-crescer-em-2047 (acessado em junho de 2019)
3 Protocolo Clínico de Diretrizes terapêuticas
Doença de Alzheimer; disponível em https://conitec.gov.br/images/Relatorios/2017/Recomendacao/Portaria_Conjunta_13_PCDT_Alzheimer_28_11_2017.pdf; (acessado em junho de 2019)
4 Bula do medicamento; disponível em https://www.anvisa.gov.br/datavisa/fila_bula/frmVisualizarBula.asp?pNuTransacao=23574372016&pIdAnexo=3933177 (acessado em junho de 2019)
5 Winblad B et al. IDEAL: a 6-month,
double-blind, placebo-controlled study of the first skin patch for Alzheimer
disease. Neurology. 2007 Jul 24;69(4 Suppl 1):S14-22.3-Adaptado de: Gauthier S
et al. EXACT: rivastigmine improves the high prevalence of attention deficits
and mood and behaviour symptoms in Alzheimer’s disease.
6 Alzheimer: o que é, causas, sintomas,
tratamento, diagnóstico e prevenção; disponível em https://www.saude.gov.br/saude-de-a-z/alzheimer (acessado em junho de 2019)
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